Ainda me lembro da primeira vez que passei os olhos sobre as
escritas de Álvares de Azevedo. A primeira sensação? Paixonite aguda. E durante
alguns anos, ele continuou sendo o top autor de cabeceira. Em todas as suas
obras – mas de fato a que mais me encanta é Noites na taverna, ele traduziu em
crônicas, prosas, poemas, uma das minhas
leituras sobre o amor. O amor é pessimista, melancólico, saudosista e até libertino. Aos bons entendedores é óbvio o
sentido detrás das palavras tristes. O
amor aguça a sensibilidade, e os que tem o tino para este comércio, farejam de
longe qual for a emoção.
(E ao ler, os que se consideram amantes em potencial, pensarão: Libertino? Comércio? Ela nada sabe sobre o amor!)
Eu
imagino o olhar triste deste homem ao escrever cada uma de suas palavras e
quisera ter nascido a tempo de conhecê-lo antes de seu último suspiro. Ainda me soa estranho homens que falam de amor
tão justamente e com conhecimento de causa. Verdade seja dita, ainda que os
maiores nomes sobre o assunto sejam masculinos, em nosso dia a dia poucos são
os que dissertam sobre o amor de maneira tão sincera. (E eu tive o prazer de conhecer um!)
Minha
primeira leitura sobre o amor foi assim. Baseada em cores cruas, sem textura,
frias, frígidas, maçantes, ingratas, inconstantes, egoístas. E há quem pense
que isso não é amor! E há o meu pensamento de que o amor é assim, lhe deixa a
flor da pele e suscetível ao menor resquício de impaciência que possa existir
no olhar dele. E poucas são as pessoas que interpretaram Álvares, Olavo e Augusto
desta forma. Eis a forma mais exata de se definir o amor. Exata e para poucos
neste mundo.
É certo
o tanto adoro falar sobre flores, sorriso e gosto de morango. Tão certo quanto
são lindos os dias de sol ao lado dele. Mas a continuidade é marcada pelas
tempestades e pelo gosto de creme de barbear que aparecem ao menos uma vez por
semana. E isso é o amor.
A nova
e última não passa de uma releitura. Agora não só na teoria, mas vivenciada a
cada encher e esvaziar de ar dos pulmões. Desde a primeira impressão, ao primeiro
erro, e o último sorriso. E todas as sensações que mantém vivo o que muitas
pessoas deixam morrer todo dia. Se depois de um terremoto, se reconstrói cada
minúscula casa, existem dois sentidos: você não quer se mudar e vale a pena se
manter naquele local. O sentimento mais lindo do mundo é coisa de perdedores,
pois só os perdedores continuam lutando em prol do que tanto querem. Só os perdedores
têm a sensibilidade para rever os erros e continuar lutando mesmo quando todo
mundo os chama de fracassados. O que é o fracasso para quem ama? Um impulso de
uma cama elástica. Uma psicologia reversa. Um tanque cheio de gasolina. Uma
xícara de café nos momentos de sono. Uma noite bem dormida para quem precisa
trabalhar no outro dia. O nascer do sol para quem precisa de inspiração.
E se me
perguntam o que é o amor, creio que eu defina de uma maneira diferente como
meus grandes orientadores. Amar é optar pelo cultivo de seus próprios espinhos.
É não se importar quando se é machucado e em alguns pontos até gostar da
ferida. É entupir suas narinas para que ele possa respirar. É sentir o gosto de
creme de barbear, escovar os dentes, sentir, escovar de novo e estar sempre
comprando novas escovas. Porque vale a pena sentir o gosto ruim vez ou outra. É
ter dois reais na carteira e comprar dois pacotes de miojo ao invés de uma coxinha.
Ceder o melhor travesseiro, ter sempre o colo afofado, engolir o ódio e forçar
que se está calmo para que ele não quebre o mundo na porrada.
É o
primeiro e último pensamento do dia, sendo também o motivo tanto de sonhos
quanto de pesadelos. O motivo dos
sorrisos mais bobos e das lágrimas mais sofridas. Amar é não se importar em
ferir seu orgulho, em deixar de ter espaço, em ser jogado pra fora da cama, em
ser taxado de idiota, e tantos outros rótulos que os reprimidos inventam.
Que os
utópicos me perdoem ao romper o conceito de amor que querem defender. Que os
reprimidos aceitem que não amam por não saberem amar. Que os invejosos amem
alguém e passem a ver o quanto isso é bom e real.
Sim. A
minha leitura do amor não é perfeita e bela, é simplesmente honesta como um
jornal de 25 centavos cheio de tragédia. Não tem muitas cores e nem as famosas
borboletas no estômago. A minha visão mal do século tem uma certa tristeza
enrustida. Assim é o amor, te massacrando o tempo todo para que você se torne
uma pessoa melhor simplesmente para ter mais sorrisos e olhares ternos, para
ver no outro o bem estar que quer para si mesmo. Ficar instável ou numa linha
de trem esperando apenas ser atropelado para se recuperar e lá ficar novamente.
Mesmo que isto custe a sua vida. Afinal, nada mais é só seu.
Eu vou construir a minha vida em cima de uma
placa tectônica! Isto sim me representa
o amor.
* Meu
espinho está personificado e datado com
26 invernos. Tem em torno de um metro e
meio de altura, cabelo escorrido, olhos pequenos, um mau humor gigantesco e o sorriso mais sedutor do mundo.