sábado, 29 de dezembro de 2012

Um pouco de tudo o que acaba



Vou me formando de um pouco de tudo o que acaba, e obviamente de tudo o que sempre permanece. Dos primeiros  aos últimos intercalando os eternos.
Sou um pouco da minha primeira boneca, do primeiro batom, do primeiro perfume. Do meu primeiro passeio de pedalinho,  do primeiro algodão doce, do primeiro beliscão, do primeiro castigo e do primeiro 10 na escola. Do primeiro beijo, da primeira vez, do primeiro amor, da primeira decepção. Do primeiro chifre, da primeira poesia e da primeira música que compus. Do primeiro porre, da primeira sms que mandei entorpecida, da primeira lágrima de amor, do primeiro abraço de perdão. Do primeiro colo que me consolou, do primeiro Eu te amo dito publicamente e da primeira lembrança de todas as primeiras coisas.
Sou muito dos últimos acontecimentos. Do último fracasso na faculdade, da última crise de depressão, do último beijo, do último perfume que impregnou  meus travesseiros. Da última bebedeira pra esquecer o que se quer é esquecível, da última vez, do último amor, da última vontade e da última coisa que me fez chorar.
Assim são todas as pessoas. Uma parte daquilo que é primeiro ou que é último, mas que faz parte daquele momento que  te marcou a memória, o coração e as vezes até o corpo.
O fato é que somos parte de tudo o que acaba. E tudo acaba o tempo todo em qualquer parte do mundo.
Em alguns segundos você pode deixar de ser parte dos planos de alguém e pode ser o suspiro de outro. Pode arrancar um sorriso bobo,  uma lágrima, um calafrio.  Você é desde aquela inicial gravada numa árvore àquele arranhão que marcou alguém por amor.  Você se eterniza a cada ação que deixou em alguém a nível físico ou sentimental. Por isso cada momento é importante.
Somos feitos de instantes assim como os quebra-cabeças são feitos de pequenas peças e um castelo pode ser montado de lego ou areia.
Sou aquele café da manhã que preparei com carinho e servi na cama. Aquele machucado deixado sem pudor numa situação sem mais pudor ainda. Aquela primeira vez daquele menino bobo e apaixonante.  Aquela má resposta naquele outro. Aquele sofrimento da adolescência de outro. Uma carta de amor no fundo da gaveta já mofada após 15 anos, o motivo de uns terem aprendido a nadar e de outros terem afogado. Aquela piada que não parecia ter a menor graça, mas se encaixou em uma situação, aquele lugar, aquele cheiro de morangos e aquele motivo de brigas.
Quero ser aquele motivo de risos dele. Aquele telefone na agenda com magnetismo com os dedos, aquele jardim bem cuidado com rosas que espinham apenas quando se sentem ameaçadas.  Quero ser o plano de alguém, o colo, o conforto, a companhia. Quero ser o motivo de discussões interessantes e de gargalhadas bem dadas nos momentos mais errados para aliviar a tensão.
Quero ser a tensão sem o n, roma ao contrário, o motivo de se mostrar os dentes numa posição arqueada formando um ‘U’, o que parece nó na garganta e é frio na barriga, o coração após chegar de uma corrida de São Silvestre, a primeira gota de água após 30 minutos pedalando no sol de meio dia, o oposto ao pesadelo, o inverso de sanidade, a tremedeira nas pernas, o que vem na cabeça quando se quer pensar em outra coisa, o cobertor, o café quente sem açúcar, o último fósforo e a última vela quando a luz acaba, a única dose de conhaque que se tem em casa no inverno, o rolador de dados necessário nas horas de solidão...
Aproveite  e se faça nos momentos. Somos realmente uma parte de tudo que acaba. E pequenos instantes são as chances de se conquistar o que se quer. Faça uma boa imagem em poucos segundos. Isso pode custar a sua felicidade.

sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Transformação

E um dia a gente se olha no espelho e já não é mais a mesma pessoa. O tempo passou... Já existem marcas de expressão, olheiras, e um semblante mais adulto. Andar de meias perde um pouco a graça, se quer pisar no chão para ter o mínimo que se seja de realidade. Os sonhos mudam. Pintamos o arco-íris em tons de branco, passando pelo cinza e chegando ao preto. Ou preferimos ver o arco-íris somente quando ele aparecer. Começamos a ver que as flores, bom, elas morrem, e nós não choramos por elas. Mas as usamos quando morremos para que chorem sobre nós. Não meu amigo, quando você morrer eu não vou lhe mandar uma coroa de flores! Vou lhe mandar flores enquanto você estiver aqui comigo.
O tempo passa e a gente nem se dá conta, e de repente já se vê mulher. Com problemas de mulher, assim como a mamãe várias vezes teve e agente achou que era velhice. E hoje damos a essa velhice o nome de maturidade. Todos os dias uma dor, um problema a resolver, reclamações, noites não dormidas. E aí a busca do que uma vez vi chamarem de "alegria artifical". A cápsula da tranquilidade, da felicidade. Me viciei nelas, mas ainda não me sinto tranquila ou feliz o bastante. Sem o equilíbrio elas não são nada. A vida da gente só muda quando resolvemos que ela deve mudar.
Hoje, me vejo mais mulher e decidi que ela deve mudar. O amor, bom, ele as vezes passa como as flores, as vezes deixa seu perfume, as vezes só as folhas secas. Talvez o pássaro que ama o peixe vai viver pensando nele sem poder tocá-lo. Talvez ele atinja o equilíbrio e possam se encontrar as vezes na superfície da água, à margem de algum rio. Talvez o pássaro aprenda a nadar, e dar mergulhos profundos, ou o peixe aprenda a voar.
Talvez eu aprenda a ser mulher. Talvez você aprenda a ser meu amigo. Talvez saibamos a hora certa de mandar as flores... aprendamos a cultivar um canteiro. E com isso pode ser que eu aprenda até a hora de dar os telefonemas. E de reclamar da dor. E de tomar as minhas pílulas. A verdade é que hoje despertei para algo que existe dentro de mim, uma pessoa querendo ser madura com a doçura de uma criança. O tempo, ele passa para todos nós. É! Ele não volta atrás... Não, não quero mais tempo. Quero sorrir, e encarar a "velhice" como a mamãe. E ter as minhas responsabilidades. E meus sonhos um tanto quanto modificados.
Sabe, as vezes a vida é dura demais com a gente.

É a ela que ele ama

E todas as noite é nos braços dela que ele vai desejar dormir. Por mais que você faça o possível pra que ele chegue a fechar os olhos nos seus. Ele nunca vai pegar no sono. Ele nunca vai sonhar ao seu lado. Nas madrugadas ele sempre vai se levantar. E por mais que ele insista que você é linda enquanto dorme é nela que ele vai estar pensando. E de repente quando você acordar e ele não estiver ao seu lado e você encontrá-lo em algum canto da sala, nunca acredite na hipótese da insônia. Ela é a insônia dele... E sempre será. 
Ele vai procurar em você os perfumes dela, o jeito dela se vestir, de arrumar os cabelos, de sorrir... Ele vai procurar em você os defeitos dela. E de repente sem pensar ele vai te envolver numa comparação com ela. E aí vai dizer que foi sem querer. É no sorriso dela que ele pensa quando vê o seu. Desde a maneira de mexer os lábios até o brilho dos olhos. E é na burrice dela que ele pensa quando vê a sua inteligência. Se eu falo de política ele acha uma gracinha quando ela fala sobre os 10 mais gostosos da televisão brasileira. Você pode se dedicar exclusivamente a ele, mas isso não vai mudar nada. Por mais que ele veja em você a menina boa, pura, inocente, que o mundo sempre fez questão, por mais que ele saiba que a melhor opção é te amar, por mais que ele molde o amor por você, o amor não tem forma. Ele sempre vai amá-la, com todos os defeitos. 
É pra ela que ele vai correr quando você for um pouco mais severa com ele. E é nos lenços de papel do banheiro dela que ele vai enxugar as suas lágrimas. Lágrimas que muitas vezes você não quis deixar cair. Ele não pode impor que deve te amar. Ele não vai conseguir isso. Vai te fazer feliz apenas por ilusões e promessas. Que jamais serão cumpridas. Não porque ele não quer. Mas porque ele não pode. Ele não pode criar o amor... Nunca vai poder. Ele precisa apenas aceitar o amor que sente por ela. E não procurar em você o modelo de amor perfeito. Sensibilidade, carisma, tudo em vão... Ele ainda usa o sabonete que ela gosta. Ele ainda usa o desodorante que ela gosta. O celular dele ainda tem o toque que ela escolheu. O tempo passa pra ele no tempo dela. E ele te tem nos braços dele querendo encontrar algo dela em você. Alguma rendinha numa camisola, alguma música, alguma comida que você se aproxime da dela. É nela que ele vai pensar sempre... Sempre... E em você como um degrau pra perfeição de um amor que nunca vai existir. Ele não tem ela como dona dele. Mas o coração dele definitivamente só pensa nela...

quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Tudo se compõe e se decompõe

Se encontraram por acaso, em uma dessas esquinas de qualquer rua, em uma coincidência sem fim. Ela deixou seu coração cair sem querer e ele pegou, também sem querer. Nenhum dois dois queria, mas o destino lhes negou o querer. O mesmo destino que queria que fossem felizes não deixou que optassem por serem felizes sós. Tinha que os unir de alguma forma. Por bem, ou por mal, como fora. Por mal porque não eram maduros o suficiente para se envolver. Ela sem medo, ele com todo o medo do mundo. Medo esse que os fizeram se desentender várias vezes. Assim como os sonhos dela. Não havia muito equilíbrio. Ela sonhava e ele o acordava nos ápices dos sonhos. Mas mesmo assim tentaram, achavam que valia pena. Como realmente valia.
De repente os dois eram um só. Ele aprendeu a sonhar uma vez por semana, e ela a ser realista e assistir os telejornais. Daquele encontro por acaso, uma paixão desenfreada, louca e dessa um amor intenso e extremamente impulsivo. Assumiram o sentimento. Isso depois que ela viu que no fundo ele era um menino sensível, que só tinha medo do mundo. E ele viu que ela não fugia por querer e sim por medo de se decepcionar. Mas após uma proposta de namoro olhando profundamente nos olhos, o amor foi posto em primeiro lugar. E todas as fobias foram esquecidas.
Ele procurava sua primeira namorada. Ela encontrou nele o seu primeiro amor de verdade. E aí foram rumo ao mundo, enfrentando cada obstáculo. E como eram felizes! Entre uma caipirinha e outra filosofavam sobre a vida. E no fim sempre chegavam em casa brigando, mas no outro dia era colo, eu te amo, pipoca, brigadeiro e a eterna certeza de que eram almas gêmeas. Se identificavam até nos joguinhos preferidos de video-game. Assim passavam tardes brincando como crianças e realmente tinham alma de crianças. Sem querer se xingavam como crianças e depois estavam mil maravilhas de novo! Todo mundo achava lindo a forma como se tratavam, engraçada ao menos. Piadas, brincadeiras, uma alegria contagiante. Ela as vezes bebia e falava um monte de bobeiras e ele ficava quase roxo de vergonha. Assumiam tudo o que faziam, assim como o que ainda não faziam. Assim como quando fizeram. Era tudo especial entre eles. Novidades para os dois, um mundo que ainda não tinham provado.
Devagar foram se descobrindo. Viram coincidências demais em suas vidas. Desde as piores até as melhores. Ele achava ela a menina mais linda do mundo, olhava em seus olhos e com sua pureza a fazia acreditar. Ela tinha a impressão de que até então só tinha tomado água e de repente tinha conhecido os sucos e refrigerantes. Formavam o casal perfeito. Até nos defeitos. Dormiam por horas e mais horas e achavam graça de somente dormirem juntos. Se viciaram. Ela nele e ele nela. A vida de um não fazia mais sentido sem o outro. Nenhum sentido. Ele aprendeu a chorar nos braços dela. Ela aprendeu a se consolar nos braços dele. E tudo foi perdendo tanto o sentido que um passou a viver para o outro.
Erraram muito. Ela com ele e ele com ela. Até que ela precisou abrir mão de um grande sonho. Teve que acordar como ele tentou fazer muitas vezes. Mas ele ficou ao lado dela mesmo acordada. E ele foi incentivado por ela a sonhar. E ela acreditava nos sonhos dele. Ela tinha muito orgulho dele, sabia que ele podia ir mais longe do que pensava. E assim foram trocando conceitos de vida. Sempre!
Chegou um a um ponto em que a imaturidade de ambos falou mais alto. E ao mesmo tempo um senso de maturidade. Sabiam que já não podiam viver mais um pro outro. Ainda havia muito a ser feito pelo mundo. Começaram a se desesntender em torno de 10 vezes ao dia. E a chorar de sofrimento mais que por emoção. Ele já não a deixava sonhar nem um pouco e ela começou a falar bobeiras enquanto ele via os telejornais. Isso irritava totalmente os dois. Começaram a se destratar, a mexer nas feridas. Sempre mexiam no que mais machucava. Já não tinham mais o dom de jogar video-game pra esquecer, nem de fazer piadas. Cairam numa relação doentia de amor e ódio. Regada por um ciúme sem fim. Impaciência sempre, essa passou a ser a rotina deles. Ele já não ia mais jogar futebol e ela já não se abria com as amigas.
Depois disso passaram uma semana maravilhosa. Quase perfeita. Um vivia pelo outro. Dormiram juntos todos os dias. Ela o esperava para almoçar todos os dias. Ele chegava do serviço e tinha todo o carinho e amor do mundo. Ouviram música, viram filmes, falaram bobeira, contaram piada, saíam para passear e sempre olhavam para o céu e ficavam ainda mais românticos. Ela estava radiante de felicidade. Ele também. Achavam que ali haviam encontrado o equilíbrio para o amor deles. Mas quando as coisas estão boas demais, é sinal de que algo errado vai vir. Ele não confiou nela, lembrou de coisas ruins e não acreditou nas palavras dela. Ela foi autoritária ao invés de acalmá-lo. E aí se perderam numa esquina diferente da que se encontraram. Ela chorou e ele se foi. Ambos com o coração no chão novamente. Sem esperanças de que mais alguém vai encontrar. Ela só quer que ele o pegue novamente. Ele ela não sabe. Ela tentou correr atrás, ele também. Mas cada um correu no momento incorreto. E aí não deu certo. Não conseguiram mais se encontrar. Ela não achou mais o coração dele. Ela não sonha mais. Voltou a tomar água novamente. Ele? Foi rumo ao mundo em busca de seus sonhos, que até então não acreditava...
"Tudo se compõe e se decompõe"...
Hoje, bom, não sei como ela está... Nem como ele está por dentro. Ela em sua dose de realidade não vê sua vida sem ele. Ele em sua dose de sonhos já não vê sua vida com ela... Já não consegue parar de mexer nas feridas. Ele só vê as feridas. Aprenderam a não se perdoar nunca. E ela, não está nem aí pra o que o mundo pensa, ela só pensa nele... E ele, talvez queira que ela tenha sido somente um pesadelo.

terça-feira, 11 de dezembro de 2012

Irremediável

Minha querida vovó passou pras nossas gerações, assim como tantos antigos sábios das filosofias populares passaram aos seus: “O que não tem remédio, remediado está".

Ainda me lembro daquele rostinho envelhecido pelos 80 e poucos verões, com um sorriso sapeca (acho que a coisa mais linda que puxei dela), vestido de tecido de algodão com flores pequenas estampadas, cinto marcando o corpo já curvado pelo tempo e um perfume de rosas que não era perfume e sim o cheiro dela junto a seu implícito amor pelas flores. Assentada em sua cadeirinha de balanço, citava coisas que pra mim antes não tinha nenhum significado. Sabe vovó, hoje acho que mudei muito de opinião quanto às suas citações. Com o tempo, elas passaram a fazer um enorme sentindo em minha vida. E se daí de cima souber disso, me perdoe por tantas vezes achar que os seus ditados eram ‘caduquices’.

Creio que na maioria das vezes, a intensidade é o maior mal que podemos ter. Pode ser acústica, física, radioativa, sísmica. Se placas tectônicas não tivessem tanta intensidade em seus movimentos, não teríamos os terremotos. Se minha energia não tivesse tanta intensidade em sua propagação eu não teria essa sinergia abalada. Onde encontrar a fórmula física de equilíbrio da intensidade? Acho que Einstein foi embora rápido demais, um tanto antes de poder me estender as mãos.

Eu não tenho controle de intensidade quando penso em certas coisas. De repente parece que elas surgem como um meteoro ou estrela cadente e meus olhos e meu corpo vão seguindo até que o estrago seja feito. Desculpem-me os que acreditam nas estrelas cadentes, mas em seu destino final elas nunca realizarão seus desejos e ainda causarão algum dano onde caírem. Assim como os meteoros. Os coitados são sempre vistos como os ruins da história. Bem, a maioria das histórias são sempre mal contadas.

E vou criando analogias que por fim, nem eu mesma entendo, começando de uma antiga citação, passando pelos significados de intensidade, de meteoros e estrelas pra cair no que considero algo muito clichê e que só Paulinho Moska, Tom Jobim, Chico Buarque, Arnaldo Antunes, Nando Reis, Otto e alguns outros de meus cantores/escritores preferidos tiveram o feeling para definir de maneira simples.

 Então, começo, o que já está pela metade explícito e que nunca vai ter um final, com um trecho de Mário Lago (Aquele velhinho simpático, dos olhos claros que comovia nas novelas e muita gente nunca leu nem metade das coisas maravilhosas que ele fez):

“Chorar o que já chorei, fracasso eu sei
Fracasso, por compreender que devo esquecer
Fracasso, porque já sei que não esquecerei
Fracasso, fracasso, fracasso, fracasso afinal
Por querer tanto bem e me fazer tanto mal”

Tenho as lembranças filmadas em minha cabeça, algumas apenas fotografadas. Outras, sinto só de fechar os olhos. Algumas me arrancam sorrisos de canto de boca quando menos espero, outras me arrancam lágrimas. Algumas me fazem ter vontade de viver, outras não. Há ainda aquelas que ainda não consigo definir nem mesmo encontrar, mas que estão expostas escancaradamente no fundo dos meus olhos e mudaram meu jeito desde que percebi que tudo era irremediável.

Nenhuma migalha de tempo foi jogada fora - disso me orgulho. Foram muitas coisas bem aproveitadas, muitos momentos que posso escrever um livro que não sei se seria dramático, filosófico ou cômico. Mas algo me diz que esses momentos ainda não terminaram. Pelo menos sinto que minha participação na história ainda não se findou. E tento encerrá-la a ferro e fogo. Bom, isso parece piorar. E acreditar em destino e acaso me soa como a coisa mais ridícula do universo.

Mas preciso ser forte. Preciso ter paciência e estudar o alvo. Não adianta flecha sem alvo!  E que então essa filosofia se implante em minha cabeça. Ainda não é tempo de ser flecha. Flechas podem acertar coisas erradas quando não são miradas direito. E nesse momento não quero ser um joguinho de dardos de crianças. A situação é séria. E não quero que um tapa na cara acabe novamente com todo o encanto que eu tenho. Receber esse tapa é simples, perdoar também, mas os danos agravados não são curados nem com um milhão de pontos de sangue.

Sinto que foi naquela manhã de sábado que tudo mudou. Bom, foi uma manhã inédita em minha vida. Quando acordei e observei,  observei de um jeito diferente, tudo o que acontecia como sempre, aconteceu diferente. A sensação foi indefinível. Sabe quando a gente tá naquela frescura  pra lavar alguma coisa com a mangueira num pavor enorme de sentir frio? Devagar vamos entrando na brincadeira e quando ficamos a par da situação já estamos completamente molhados. Eu me entreguei dessa forma. E senti o mesmo frio de estar molhada depois. Na verdade, as vezes acho que nem é frio o que sentimos, é uma necessidade de nos encolher protegendo-nos de uma sensação diferente. Senão peixes, não seriam peixes.

O único arrependimento foi não ter falado no fundo dos olhos quando eu pude. Quando perguntada, retruquei a pergunta com um ‘você sabe o que é?’ e fui respondida com o ‘imagino que sim’. Essa oportunidade sim foi perdida. Mas ela não mudaria nada. Disso tenho certeza. Mas prefiro realmente me arrepender do que faço. E hoje acho que já nem tenho aquela vontade de dizer de novo. Sabe quando passa? Então. Passou.

Vou levando as coisas como dá. Penso que uma caixa de leite azeda em uma semana, uma garrafa de coca-cola perde o gás três dias após ser aberta, o café esfria em menos de 12 horas após feito, o pão endurece em dias, o gelo se desfaz em minutos, garrafas de vidro duram pra sempre, diamantes também. Grafite enterrado há determinada profundidade e em um milhão de anos torna-se diamante. Quartzo antigamente não tinha o menor valor. Turmalinas eram achadas como as piritas em algumas regiões. As piritas eram valorizadas, as turmalinas não. Até que ouro mostrava à pirita que ela não tinha valor. E quem tinha era a turmalina que estava jogada em qualquer canto. São tantas relações... Tantas analogias mais podem ser feitas.

Só sei que os sábados hoje têm um valor diferente. Quando acordo e olho pro lado e não vejo e nem sinto o perfume. Nem as quartas a noite e nem as quintas pela manhã. Não tem mais papel de paçoca jogado no meu chão. Nem x-bacon no café da manhã, ou alguém me dizendo que o macarrão com peixe estava delicioso e me mandando lavar a pilha de louças que fica em cima da pia. Mas em prol daquele magnetismo que começa na garganta e acaba no peito, causando arrepios nos braços e na barriga, eu fiz tudo o que eu podia. E que tenho certeza que também arrancou grandes gargalhadas.

Uma música me lembra os momentos: “Gosto de ver você dormir, que nem criança com a boca aberta”... “Vem cá meu bem, que é bom lhe ver. O mundo anda tão complicado, e hoje eu quero fazer, tudo por você”.

Mas encerro o texto com algumas coisas.

Como diria Quintana: “Tão bom morrer de amor e continuar vivendo”. Então, deixa o pau quebrar.

E meu caro Carlos Drummond de Andrade, quero adicionar um trecho a um famoso poema seu, título de um de seus melhores livros:

E agora ******* ?

Por favor, não fale nada!

* Não tem remédio, remediado está

domingo, 18 de novembro de 2012

Encantar, cativar, perder



Doutor,
Hoje preciso que você fique no divã para estar mais confortável ao me ouvir. Talvez o melhor fosse uma espreguiçadeira na praia e um drink de abacaxi com vodka para lhe distrair um pouco, afinal sei que minha retórica não chega nem perto de ser das melhores. Ou uma rede no meio do campo onde o cantar dos passarinhos pudesse lhe distrair dessas minhas confusões mentais extraordinárias. Mas nos contentemos com o que temos, relaxe nesse divã enquanto lhe faço um expresso e desabafo o que está me corroendo. Sinta-se a vontade para tirar uma soneca.


            A vida não passa da junção de três fatores: encantar, cativar, perder.
Se embevecer por uma pessoa é algo natural. Tão simples como tirar remela dos olhos. Acho essa uma das ações mais simples e que poucos se dão conta. É fato: acordamos, nos alongamos naquela mistura entre querer esticar para o mundo e despedir-se daquele sono revitalizador. Agora o mais gostoso é quando acordamos e vemos aquele rosto lindo ao nosso lado (mas que as vezes nos empurrou na cama a noite toda, tirando uma pequena parte da paciência), sentir aquele sorriso de bom dia, um pequeno beijo e então nos colocar a retirar a remela daqueles olhinhos. Ah doutor, isso é umas das coisas que mais me deixa feliz nessa vida.  Acha estranho? Experimente então na próxima manhã. Você verá o que é sentir ternura.              
Quando encantados, ao contrário de apaixonados, vemos sim defeitos, e muitos. Porque o encanto é a pré-paixão, mais sinceramente, é a paixão, no entanto coberta com o véu do orgulho. Muitas coisas têm o nome de Encanto, já reparou? Pousadas, confeitarias, cerimoniais, até mesmo motéis. Se olhar a raiz das coisas verá que todas são remetentes  a um estímulo externo afável, digno daquele frio na barriga que nos arranca um suspiro, dois suspiros, três suspiros. Uma infinidade de claras batidas com açúcar e assadas por pouco tempo. Prefiro quando têm raspas de limão. É picante, dá uma pequena diferença que caracteriza como único. ELE É O MEU SUSPIRO!
Doutor, eu me encantei. Tenho tanta vergonha de lhe confessar isso. E quando confessei a ele, as coisas nunca mais foram as mesmas sabe. Acho que mensagens subliminares são a melhor forma de comunicação. Ao menos subtendidamente ninguém se sente coagido ou manipulado. Eis a fórmula da vida.
Depois do encanto, cativa-se. A maldita raposa do Pequeno Príncipe, me ensinou a coisa que é mais bizarra em minha vida. E antes doutor eu não tivesse aprendido aquela lição. Aprendi a cativar e a ser cativada. Uma palavra do meu tempo e que também deve ser do seu é fitar. Eu fitei aquele garoto até chegar ao ponto de cativá-lo. Creio que fiz isso, pois ele se abriu pra mim e me deixou afagar seus cabelos e apertar as suas bochechas. E ele me parecia tão durão em sua maneira de falar das mulheres. Sim, ele pensa em muitas mulheres o tempo todo. Doutor, me perdoa, mas eu acho isso normal. Eu também penso em várias pessoas. Ao menos pensava antes dos últimos quatro meses. Mas esse desejo vai voltar. Eu sei. Ou ao menos oro para que volte. Ele se tornou único no mundo, como uma rosa mesmo, e cheia de espinhos. Ele me espetava o tempo todo quando se fechava para uma infinidade de coisas que eu queria falar e ele sabia só de olhar nos meus olhos. Fui descoberta doutor. Me ajuda. Ninguém além de você pode me conhecer. Fiz um pacto com o senhor do mal e ele me disse que quando eu deixasse de ser mistério, a minha alma já não pertenceria só a mim. Eu quero a minha alma de volta. Quero toda, doutor. Toda. Por favor me dê um remédio para recuperá-la. Sei que você pode fazer isso.
Então doutor, começou um jogo de sedução. E eu o tive por vezes seguidas, podendo até mesmo tirar suas remelas, cuidar da sua ressaca e dividir o cobertor. Eu sempre odiei dormir abraçada, e então ele veio e quebrou os meus elos, meu orgulho e minhas pernas.  Adoro essa expressão: você quebra minhas pernas desse jeito. Doutor, ele quebrou a minha coluna. Vértebra, por vértebra e sem piedade e intenção nenhuma. A culpa foi minha e eu deveria estar presa a uma hora dessas tendo que brincar de pique-esconde com Hitler no inferno.
E quando eu vi que estava estabelecendo um vínculo forte, não com ele, mas com o gostar do carinho eu me assustei muito. Sabe aqueles traumas que lhe contei. Bom, eu me abri com ele. Depois num misto de arrependimento eu comecei a inventar uma séria de versões e no fim já não havia confiança. E não tem justificativa, eu fui uma falsa e tenho que aprender a superar meus traumas. Não posso coloca-los nas mãos de ninguém. Fico parecendo vítima, e o senhor sabe o quanto eu não sou e o quanto fui forte ao longo desse 16 anos com o nó na garganta.
Sou uma péssima jogadora. Sem um lance planejado, sem ser estrategista e fazer as jogadas certas tive o meu cheque-mate para a derrota. É doutor, eu perdi. Por minha opção. Pela minha incompetência em lidar comigo mesma. Com essa mente louca que fala tudo o que quer, que tem jeito doce, mas que de repente surta e sem fundamento algum. Não vou por a culpa em nada dessa vez. Prometo. Apenas na minha ignorância. Me senti pressionada e pressionando. Mas no fundo eu lhe juro em nome do que você acreditar que não era a minha intenção. Mas agora doutor, não dá mais pra voltar atrás.
E pra terminar, vou lhe dizer o que estou sentindo essa noite.
Uma ridícula por que sei que jamais terei aquele sorriso lindo de novo. Ao menos não direcionado a mim. Nunca mais vou poder tirar a meleca que tá na ponta do nariz dele. Entende doutor, como isso tinha tanta importância em minha vida. Parece clichê e senso comum ou uma redundância de quem já ficou com mais de mil pessoas, mas eu confesso a você: dessa vez foi diferente. Dessa vez eu quis abrir mão de muita coisa por um minuto de atenção. Dessa vez eu iria até o fim, aceitando qualquer condição que ele impusesse. E eu nunca quis ele só pra mim, porque gente assim deve ser dividida. Ele pode mudar a vida de muitas pessoas. É um pensamento liberal doutor?  Acho que minha cabeça está a frente do tempo em que vivemos onde todos querem possuir. Eu não.
Lendo Platão há algum tempo atrás eu quis ressuscitá-lo só para ver se ele teria a cara de pau de falar na minha cara que “ A melhor maneira de amar, é amar desprendido de egoísmo”. Acho que eu quebraria todos os dentes de Platão por ele ter dito algo tão imbecil, Doutor. Eu errei. Platão estava muito certo. Acho que ele me jogou uma macumba pra parar de pensar que as pessoas só queriam a procriação como pregava Schopenhauer.
Agora doutor de o senhor tiver o mínimo de consideração com a minha vida, não se levante desse divã e diga que é amor. Seu silêncio me consola.

domingo, 14 de outubro de 2012

Enigma

     A lembrança vem intempestivamente quando a prolixidade da vida trás uma série de fatos à mente. Coisas banais levam à uma dialética da mente com a alma, refutando as hipóteses de experimentação de Kelinger, ou qualquer outro cientista que trate tudo como matéria, ciência e fórmula. É como se Pasteur tivesse criado uma abiogênese de sentimentos. E bem, realmente foi uma geração espontânea de um sentimento intensa e extremamente alienígena.
     Sempre tão exata, lógica e prática quis estudar um algoritmo que diagnosticasse tudo o que era tão subliminar dentro de minhas conexões sinápticas. Talvez tivesse queimado mais rapidamente todos os meus neurônios com essas explicações do que com o uso de cannabis ou ópio.
     E em meio a tantos dilemas biológicos, físicos e matemáticos, não houve uma integral, derivada, teoria da evolução ou fórmula de energia quântica ou cinética que me desse uma coordenada para um resultado final. Nem eixo x, nem z, nem y. Nem Bhaskara, Pitágoras, Darwin, Mendel, Newton, Galileu, ou Benjamin Franklin. Tudo e todos que até então me explicavam a vida, foram falhos nesse momento. E agora? Qual fonte de pesquisa usar? Como achar uma explicação sensata e que gerasse em mim a saciedade dessa busca que inquietava meu ego?
     Plano B. Humanas. Nietzche aconselhava em grande parte de meus questionamentos bizarros. Quantas vezes Zaratustra falava coisas que prendiam e me explicavam tanto. Quantas vezes vi coisas que eram feitas além do bem e do mal. Quantas vezes o niilismo foi tão prático como justificativa. Platão também sempre esteve em cabeceira, teorizando a questão do desprendimento e da falta de egoísmo. E Lacan por fim me afirmava coisas surrealistas que justificavam fenômenos como amor, ódio e agressividade. Mas nada se encaixava na totalidade do que eu buscava...
     E a mente atormentada, lógica, teórica e sempre pouco prática.
     Ah! Alvarez de Azevedo. Talvez esse sim, em seu pessimismo me dissesse o que eu precisava ouvir. Ou Flaubert me mostrasse que não se passava de um bovarismo imbecil.
     Só sei que naquela noite, maldita noite, o estado etílico me atingiu como uma ação que gerou uma reação que então trouxe uma mudança em minha vida. O ceticismo sentimental foi quebrado pelo sorriso mais lindo que eu poderia receber de alguém. E depois o paradigma de que todo mundo do meu clico social era fútil e não plausível de acrescentar nenhuma forma de conhecimento para mim, foi descartado em alguns meses de conversa fiada, engraçada e instigadora de desejos incontroláveis de repetir aquela noite.
     Enfim, foi inevitável que aquele contato acontecesse novamente. Em meio a desencontros o encontro inesperado (ou não), confirmou a tese que me intrigava de que aquele sorriso certamente era capaz de me tremer as pernas e disparar uma sinergia que envolvia minha alma em um mundo paralelo e descartava todos os princípios que sempre carreguei como base de respostas.
     E foram tantos por quês. Tanta pesquisa em google, ask, sessões de terapia e psiquiátricas. O fato é que aquela aura iluminada me trouxe uma nova visão de mundo, de sorriso, de patifaria intelectual, de ampliação de amizades, do diabo a quatro com o rabo entre as pernas. Surrealismo e muita dificuldade de aceitação. E os pensamentos lógicos e teóricos vieram numa segmentação de coisas ainda mais inexplicáveis, palavras soltas que causavam aquela espontaneidade estranha ao se olhar para o teto, ou fechar os olhos e contentar-se com palavras dispersas que tinham no fundo todo um significado:
     - dálmata, sorvete de flocos, algodão doce alvo, chocolate branco com gotas de chocolate preto, pinguins no meio da neve, ameixas na cobertura de chantilly, bola de futebol, beijinho de coco com cravo, doce de leite ninho, papel branco com bolinhas pretas... ah, tantas coisas mais, que poderia perder muito tempo com comparações, senão todo o tempo do mundo.
     E na convivência, surpresas cada vez mais encantadoras, vontade de sempre cativar, medo de perder, sorrisos lindos e inspiradores e uma companhia insubstituível. E sempre mais palavras remetendo à materialização de alguém que fez e faz diferença:
      - bisnaguinha, requeijão com cheddar, doritos, campari, whisky, suco de goiaba, pimentinha, confete, incenso, filosofia, psicologia e muito mais que ainda pretendo conhecer.
      E os por quês? Talvez seja melhor não procura-los mais. Creio que eles nem sendo porquês escritos juntos, me explicarão coisa alguma.
      Eis que um sorriso veio e me tirou todas as teorias de relatividade, ação-reação, evolucionismo, desprendimento, egoísmo, posse , seleção natural, pessimismo, narcisismo, imaginação excessiva e sei lá mais o que.
      Sem rótulos. Só por ser assim, tão especial.
      E volta então aquela antiga vontade de escrever.